quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Multidão de coisa nenhuma

É o terror vestido de gente.
Pessoas por todos os lados e você só quer um canto
para bater nas teclas.
Hora essa, em 2009 um computador
custa meia dúzia de centavos.

Eles não te entendem,
eles dizem:
“cara, você está sempre de mau humor”
Enquanto você pensa:
vou rir de que, da sua cara palhaço?

Saudades da pensão, do quarto escuro
e do caderno cheio de orelhas,
do conhaque, das pizzas congeladas de calabresa,
saudades de mim...
agarrar a merda com as duas mãos
é parar de escutar seu coração
e começar a escutar a sociedade,
os espertos...

Que estão sempre correndo e devendo,
sempre com o cu na reta,
com medo de perder o que nunca tiveram,
com medo de serem mortos por
suas próprias armas nas mãos de outros.
Com medo de acreditar
Ou ter um amor,
Com medo do medo.
Comprando sonhos e vendendo mentiras,
sem coragem de se esconder,
assim como eu,
que não os aporrinho perguntando
cadê os seus sorrisos,
pois compreendo o seu pavor.

Ninguém pede pra nascer, muitos pra morrer

Fumaça, dedos, pés descalços
e uma porta fechada.

O cigarro é uma ampulheta
incapaz de marcar o tempo
necessário para escrever
um poema completo,
assim, como uma vida é curta
para brindar a perfeição.

Luz, olhos fechados, nada.
Barulhos noturnos cobrem a noite
ecoando mil e uma canções caninas carregadas
pelo vento, que bate a janela,
assustando os demônios existentes
na falta de respostas.

Sorriso, sopro de ar...

Existem poetas morrendo
em livros, camas, quartos, restaurantes,
cafés, bares; inclusive em igrejas
e não os vemos.
enxerga-se menos da rua
através de uma janela aberta,
do que dentro do quarto
com a janela fechada.

No escuro introverte-se a confusão,
as luzes dos postes, vozes, o desespero.
Pedidos de ajuda, gargalhadas, beberagens,
jogos, mares de lágrimas, futilidade,
prazeres, amor e morte.

Sonhos, expectativas,
confiança, esperança, onde?
Se o planeta terra é o maior
manicômio do universo
e não foi feito por nós.

Ninguém pode imaginar

Quando criança
Sonhava com uma mulher de unhas verdes.
Deve ter sido porque minha vó tinha unhas enormes.
Ela coçava minhas costas com elas,
Era ótimo.

Agora, um pouco mais gordo,
Perdido e sem rumo.
Longe de tudo,
Conheci alguém de novo.
Meu, ela é linda e,
Eu poderia morder todos os seus defeitos
Engoli-los e leva-los pra casa.
Mas nada é tão fácil.
Há muita água pra rolar
E talvez,
Esfrie tudo isso.

Amigão?
Você que está lendo isso,
Tenha certeza:
A vida é boa pra caralho.
Passei sete dias dentro de um navio
Repetindo isso,
Mesmo sem uma garota de unhas verdes,
Pretas, ou azuis...
A vida nos prega surpresas e
Eu sou apaixonado por elas,
Mesmo abdicando delas
Às vezes.

Que a jornada continue
Comigo aqui
Cagando-me de medo
Por ser fraco e mal organizado.
Temendo não torna-la a vê-la
Pois as coisas mudaram.
E elas estão sempre mudando.

Espero construir algo concreto
Com a felicidade que me for dada,
Para nunca mais
Sentir-me tão bem
E mal
Ao mesmo tempo.
Por ter tudo
E não ter nada.

O cara gosta de sofrer e é bem bom

Sigo admirando e perdido
pelas mulheres que embarcam
e se perdem dessa caravana
insana do amor.

os coices e os murros,
mais e mais sussurros...
elas gritam:
querem entrar!
elas falam,
falando e falando
sem parar

máquinas de prazer
é tudo tão fácil
e você goza,
esquece e acorda o medo,
a cobrança,
seja grana ou seja “me ama”.
a faca crava,
você chora,
sorri e pede mais.
mais um beijo
e esquece tudo.

sigo admirando-as,
pois como pode?
sentir eu, tanta dor
abraçar o demônio
e não se intimidar.
repetindo a mesma dança,
roleta russa de carne,
suor frio e guerra.
uma lua coberta de sangue
feito de nós lá enrolados,
dois, três, ou mais...
pares de pernas.

a saliva lava a carne
ao som de gemidos
murmurados:
é o fim.
um minuto
e se começa a morrer
de novo.

O dom da escrita

As palavras mais fortes devem sair primeiro,
como um soco atrás do outro.
Para aqueles que as lêem irem ao chão,
ou abstinentes pedirem mais...

Se não quer compartilhar nada,
o melhor é não ser calado.
Exponha o que mais gosta para agradar você mesmo:
todos desistirão de você.

Isso não é diferente do poder.
Dê o sentimento que falta a vítima.
Na escrita diferentemente dos conceitos,
os poemas são como a cerveja,
digeridos um gole de cada vez.

Quão maior for a sua expectativa,
menor será o resultado.
Faça por você e para você.
Tu és o melhor e o pior.
Nenhum bundinha intelectual
que já publicou mais de 12 livros
irá dividir um sanduíche de mortadela com você,
tão pouco te levará uma garrafa de vinho vagabundo
naquela noite em que você não tiver nada,
e o aluguel vencer ao amanhecer.

Beba cerveja, trabalhe no que gosta,
coma bastante carne e se não tiver dinheiro,
se benza, você está sem sorte cara,
e escreva sobre isso também.

Vocês têm o evangelho e eu, o poema

Vocês não precisam do vinho,
pois tem o pai nosso,
não precisam de papel e caneta,
tem as suas bocas e os ouvidos de deus.

É preciso ser fraco para escrever,
eles dizem, a poesia aflora
os sentimentos mais fortes do ser.
Será fraqueza?

Toda vez que você se coloca como
alguém está perdendo,
sempre e continuamente.

O princípio está na fé, eles dizem,
“o resto vem automaticamente”,
mas na bíblia está: “o temor a deus
é o princípio da sabedoria”,
ou seja, a prudência mantém
os dentes na boca.

Toda vez que você se coloca como
alguém está perdendo,
sempre e continuamente.

A felicidade tem um fim nela mesma,
como a filosofia, por isso,
os prazeres não podem estar ligados a ela.
Cabe ao homem usar a consciência,
não como mérito, como devoção.

Toda vez que você se coloca como
alguém está perdendo,
sempre e continuamente.

O autoconhecimento é a única
formula de modificar o meio.
Consciência, prudência e um toque de medo
não são o caminho, a verdade e a vida,
mas lhe darão um rumo para seguir.
Te livrando da mediocridade, do destino e
da cadeia, com certeza.

Vocês têm o evangelho e eu, o poema

Vocês não precisam do vinho,
pois tem o pai nosso,
não precisam de papel e caneta,
tem as suas bocas e os ouvidos de deus.

É preciso ser fraco para escrever,
eles dizem, a poesia aflora
os sentimentos mais fortes do ser.
Será fraqueza?

Toda vez que você se coloca como
alguém está perdendo,
sempre e continuamente.

O princípio está na fé, eles dizem,
“o resto vem automaticamente”,
mas na bíblia está: “o temor a deus
é o princípio da sabedoria”,
ou seja, a prudência mantém
os dentes na boca.

Toda vez que você se coloca como
alguém está perdendo,
sempre e continuamente.

A felicidade tem um fim nela mesma,
como a filosofia, por isso,
os prazeres não podem estar ligados a ela.
Cabe ao homem usar a consciência,
não como mérito, como devoção.

Toda vez que você se coloca como
alguém está perdendo,
sempre e continuamente.

O autoconhecimento é a única
formula de modificar o meio.
Consciência, prudência e um toque de medo
não são o caminho, a verdade e a vida,
mas lhe darão um rumo para seguir.
Te livrando da mediocridade, do destino e
da cadeia, com certeza.

Poemas de amor a toda hora

Encontro elas na internet
sei lá como.
Apaixono-me e desapaixono
como troco de marca de cerveja.
Mando poemas pra elas.
Umas acham “fofo”,
Outras,
algo “sexy”.

Sinto como se pudesse comer
todas elas juntas e não sentir remorso.
Tem algo errado comigo e meus poemas,
que não a como definir aqui,
nem num poema imortal.
Poemas são sentimento,
sentimentos morrem.

Agora estou tentando
arrumar grana trabalhando
como promoter de festas
para encontrar
uma dessas
belas mulheres
que se vendem por muito.

Afinal,
como uma vez
disse um sábio poeta
amigo meu:
“claro que elas gostam!
Não é toda hora
que aparece um louco
escrevendo poesia
por ai”.

Poema de amor

Existem coisas importantes em minha cabeça,
Mas só existem em minhas palavras.
Existem coisas importantes dentro da sua cabeça, agora.
Existem.
Mas na África do sul o medo é diferente,
Como em qualquer lugar do mundo,
Mas os cachorros lambem o suor de qualquer um.

Vivo como as árvores e sábio como um muro.
Este é meu coração:
Duro de derrubar, mas desfolhado como dinheiro.
Respirando através de aparelhos
E afogado como um peixe fora da água,
Mostro o caminho para quem não necessita
Sentindo-me próximo de quem sou.

Há fraquezas e fraquezas.
O mundo é grande e o homem não crê,
Pois viver é acordar.
Nesta vida se vai muito mais ao banheiro
Do que a praia.
Assim, esse é um poema de amor.
Dar sem receber nada em troca.
Desvelando a alma através da gana
É necessário dizer:

Cara...
Quantos caras,
Quantas idéias,
Quantas mentiras que se tornaram verdades,
Quanta coisa ganha sentido,
Quando os sentidos desaparecem.
Então, em cara!
Em cara quanto é forte.
Se fraco,
Apenas sorri,
Chora,
E faz
Aquilo que precisa.
Para que não seja tarde de mais.

Feliz ano novo

Quem diria,
daqui uns dias é 2010,
eu falei.

daqui uns dias?
é recém outubro,
disse ela.

já passou agosto
o inverno e
o nosso amor.
o que raios,
você não quer
mais que acabe,
a não ser esse ano
de tantas desgraças?

Pãram, pãram, pãram, pãrãrãrãrãram

Mais um carnaval
dentro do quarto.
eu, a solidão
os ponteiros do relógio,
alguns cigarros
e Paris, cada vez mais longe.

dinheiro não é problema
mesmo com ele
o que eu poderia fazer?
ficar bêbado, fugir,
pra onde?

estou preso comigo mesmo.
a selva lá fora é tão estranha
quanto minha cama desarrumada,
cheia de marcas,
que não me deixam esquecer
que o tempo só passa
pra quem vive.

há tantos mortos respirando.
olhos cegos enxergando
e eu aqui:
pulando, pulando,
na marchinha das teclas.
o confete é o cobertor.

Heis o carnaval
dos solitários,
dos acompanhados,
dos homens pijama
que só tem o agora,
para ajuda-los a celebrar
o que sempre foram.

Papel sujo de poesia

Não penso em nada genial sentado no vaso
com as calças arriadas,
olhando meus dois pés no chão;
nada de genial
quando limpo meu rabo
e enxergo o papel cagado.

Um papel sujo de merda,
outro papel sujo de tinta,
ambos são uma obra prima
sem genialidade.

É necessário muito talento
para cagar e enxergar,
dádiva que poucos valorizam,
assim como a poesia,
que suja a folha,
mas é bela,
como um papel cheio de bosta.

A genialidade está ai,
em poder estar vivo,
livre,
para sujar,
ver ou escrever,
um poema,
de fezes.

Motoqueira

“Olá motoqueira”. Eu disse,
lembrando de um desenho animado,
que na infância eu assistia na TV,
onde os personagens gritavam,
“oláááá... enfermeira”, eu acho.

“E ai”? Ela respondeu,
sorrindo com uma garrafa de ceva em uma mão,
balançando a saia com a outra,
usando uma jaqueta de couro.
Ela estava ótima, simples e bela, como a cerveja,
como o posto; que não disse nada.

Natural e diferente dos corpos
que andam desfilando por ai,
se arrastando pelas calçadas,
noites, dias;
dentro e fora dos manicômios.

Ela continuava sorrindo
e pra variar,
eu sem entender nada,
perdido como um mosquito,
era atraído pelos dois sóis azuis,
que os deuses meteram no lugar dos olhos dela.

A noite já eras,
e feito um quadro destes pintores surrealistas,
ela ficou exposta na galeria,
que eu chamo de “mente”.

Alguns fragmentos sobreviveram
a ressaca alcoólica,
e nós estamos lá:
doidos, vivendo,
ambos com cerveja e felicidade
em nossas mãos.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Anjo de Ouro

John Hills criou Buck desde seus cinco anos de idade. Quando a mãe do menino, uma índia Cherokee, que sofria com os horrores da guerra; muito doente, deixou o pequeno na sua porta, a fim de que ele pudesse ter melhores condições de vida.
Neste dia, Buck e sua mãe estavam trajando roupas de lá cruas, não processadas e de pés descalços sobre o assoalho da varanda do casebre de John. A mãe do menino de grandes olhos esbugalhados tinha um ferimento horrível à bala no braço. Ambos fediam muito. A pobre índia contou que o pai do menino havia morrido a cerca de um mês em uma batalha na Carolina do Norte contra os Yankees.
Muito atencioso e preocupado com a situação dos dois. John convidou a mulher e a criança para entrar, mas ela se recusou. A jovem índia, deveria ter, no máximo uns 30 anos. Insistia para John ficar com o menino. O louco John, como era conhecido, pediu um instante, entrou e pegou uns pães e um pedaço de carne que tinha sobre a mesa. Envolveu tudo com um pano de algodão e alcançou a mulher.
A pobre Cherokee não teria muito tempo na terra com aquele braço apodrecendo. John pensou que ela pudesse, já que queria tanto partir, morrer de barriga cheia. Ela abraçou o menino forte e o sangue grosso, cheio de pus, que saia do seu braço direito grudou na roupa do menino. Ela virou as costas e partiu. John e Buck nunca mais há viram.
O louco John estava com 50 anos, vivia em Pinewood, interior da Carolina do Sul, no condado de Sumter. E após a invasão dos Yankees no Fort Sumter teve de parar de produzir tabaco em larga escala e começou a plantar algodão, e afazer roupas de lã para a guerra. Como as que o pequeno Buck e sua mãe trajavam ao bater a sua porta no inverno de 1864.
John estava sempre de cara fecha, era um homem de poucas palavras, mas era sábio e respeitadíssimo na região. Tinha muitas terras que herdará de sua família. Vivia só desde que seus irmãos mais novos foram para guerra. E Mary, sua esposa, havia morrido no parto aos 36 anos, junto de seu único filho, Josh, que nascera morto.
Seus dias eram curtos, havia muita coisa para fazer, afinal, em tempos de guerra, ou se trabalha ou se batalha, quando não se faz as duas coisas. No intuito de ter ganhos suficientes para subornar o estado. Com os poucos escravos que lhe sobraram, John mantinha a produção de algodão e a pequena fabriqueta têxtil. Além de uma mini-destilaria de uísque no porão ao lado de sua casa. Mas há esta altura do campeonato, não havia mais escravos dando sopa, e aqueles que ficaram tornaram-se parte da família de John. Bill, Hunter, e o próprio John, davam conta da plantação, enquanto Michel, Ann e Pablito, cuidavam das manufaturas.
Bill era um escravo que trabalhava com a família Hills há anos. Muito esforçado, amava mais que tudo viver ali. Hunter apareceu nas terras de John alguns anos antes. Estava com medo e não queria ir à guerra. Trabalhava de graça, como um escravo branco, apenas pela comida e um lugar para dormir. Mas assim como os outros escravos dormia no galpão, pois a falecida Mary não confiava nele. Certa vez Hunter tomou um porre de uísque, se tornando inoportuno, falando em tom irônico com John, que lhe deu três tiros na hora, sem pensar duas vezes. Um passou por cima da cabeça e os outros dois: um em cada perna. Depois amarrou Hunter no sol sangrando e o operou ali mesmo com a ajuda de Ann e Michel. Ambas jovens escravas, que nunca foram tratadas como tal.
Era um serviço árduo, mas, todavia, viviam felizes, mesmo em meio à guerra, tinham muito uísque e boa comida. Algo raro em tempos de recessão. Produziam um pouco de tabaco para o próprio consumo, mas tudo a custa de muito trabalho e luta. Muitas vezes tinham de carregar os velhos rifles e, homens e mulheres barganhavam com o diabo durante dias e noites. Sem comer ou dormir, escondidos na plantação, em meio à chuva e até mesmo a neve, combatiam com os Yankees, que tentavam invadir a propriedade dos Hills. Os sulistas não os importunavam, pois John subornava-os. Também fornecia uísque e roupas de lã para o Fort Sumter, em Columbia.
Após o fim da guerra em 65, Pablito, Michel e Hunter, foram embora, tentar construir suas vidas em meio aos Yankees. Sonhavam em utilizar o que aprenderam com os Hills em alguma fábrica em Nova York. Queriam constituir uma família com os Irlandeses no leste do Queens. Souberam na cidade, que os irlandeses eram boas pessoas e incentivavam desconhecidos a crescerem como cidadãos americanos em busca do progresso.
John não os impediu, apenas desejou boa sorte e teve de se adaptar. Parou de fazer roupas, pois já não tinha mais um porque, a final, as compras diminuíram muito e tinha pouca gente para trabalhar e Michel, que se fora, era quem sabia mais do assunto. Todos os que ficaram inclusive o Buck, que foi criado sem mãe, mas recebeu muito carinho da escrava Ann, se dedicaram à plantação de algodão. E a produção os deixou viver bem durante o pós-guerra.
Buck aprendeu a ler e a escrever com John, assim que começou a falar, pois Buck foi dizer a primeira palavra quando completou nove anos, no inverno de 68. Nunca descobriram o porquê disso, mas desconfiavam que ele tivesse um grande trauma consigo, ou seja, presenciado um, ou muitos fatos horríveis durante a guerra civil. Era um grande menino, se criou durão, sabia das coisas, nunca tentou imitar John. Buck era autentico e mesmo na sua adolescência, não teve sinais de rebeldia. Era correto, pois valorizava profundamente o que John havia feito por ele.
Certa vez, com uns 15 anos arrumou uma namoradinha no centro de Pinewood, quando foi buscar umas ferragens para colocar nos cavalos. Apaixonou-se, mas a prostituta, foi trabalhar em um prostíbulo em Great Falls e ele chorou junto do louco John por dias, mas o uísque e o tempo curaram tudo.
Era sem dúvida um garoto incrível. O orgulho de John. Aos 19 anos já havia aprendido o legado dos Hills, de produzir o melhor uísque da região, além de ganhar todos os prêmios de tiro em Pinewood. Apreciava um livro desconhecido, que um viajante deixou para John certa vez, como forma de agradecimento pela estadia. O livro de poesias chamava-se Leaves of Grass, do poeta Walt Whitman. Buck leu e releu todos os livros que havia no escritório de John. Mas nunca pegou o gosto que ele tinha por escrever poesia. O que de certa forma deixou o louco John muito satisfeito, pois parecia que o garoto estava preocupado com coisas maiores, já que aprenderá a dançar e a se divertir, coisas que John nunca fez. Divertia-se apenas ao ver que Buck estava feliz.
A velha Ann morreu de pneumonia em 1880, após um forte inverno que assolou o condado de Sumter. Buck sofreu muito, gostava dela e fez questão que enterrassem seu corpo perto da grande árvore, na colina atrás do galpão da velha fábrica de roupas de lã. Onde a sombra, Ann contava histórias de reis africanos para ele. Buck tirou uma grande pedra do rio e rolou-a sozinho até onde estava enterrado o corpo de Ann. John e Bill fumavam um cigarro cada, olhando de longe para o garoto forte, que sobreviveu a guerra, a uma mãe índia e a um pai alcoólatra; a vida e ao futuro desconhecido: a verdadeira imagem do amor sobre pernas, com 21 anos chorando, com os cabelos grudados na cara empurrando um pedaço de rocha sobre o barranco, até deixá-la próxima da imagem enterrada de mais uma perda, numa pequena vida, de muitas perdas.
No dia seguinte John e Bill foram ver como tinha ficado a sepultura de Ann. A pedra estava muito limpa e havia um escrito talhado nela: “Ó capitão! Meu capitão! Terminou a nossa terrível viagem, O navio resistiu a todas as tormentas, o prêmio que buscávamos está ganho”. John lembrou que Bill não sabia ler, então disse para ele o que significava aqueles dizeres na pedra.
- É um bom garoto, tem bom coração. Disse Bill, após escutar a tradução de John.
- Essa frase ele tirou daquele livro, que tanto gosta, de um tal de Whitman. Respondeu John, sorrindo, orgulhoso do Buck e um tanto triste, por lembrar-se de Ann e sua garra, sua vontade de viver. E agora ela nada mais era do que comida para as minhocas, mas sua alma não estava ali, pensava John. Estava nos assados deliciosos que ela fazia. Nas lembranças dos grandes dentes que reluziam um sorriso, após Bill contar alguma bobagem. No coração de Buck, e suas manias. Manias de limpeza e organização, que não eram suas, mas sim de Ann. A alma dela estava em Buck, nele, e em Bill; que estava mudo, ao seu lado, olhando deslumbrado para o tumulo lhe perguntando: “o que mesmo você disse que isso significa”?
Bill continuava a ajudar e animar as noites, no velho sítio The Little Pinewood, tocando o seu violão, enquanto o louco John, com a cara cheia de uísque arriscava alguns toques na velha gaita de boca de Johnson, seu irmão mais novo, que morreu no apocalíptico começo da guerra em 61. Buck já estava com uns 22 anos e John já não ajudava muito no cultivo do algodão, que era a principal fonte de renda. Buck também havia começado a produzir quantidades maiores de uísque e perguntara a John se podia vender na cidade. Ele autorizou a venda, desde que nunca perdesse a qualidade. E Buck prometeu que isso nunca aconteceria.
Com o dinheiro extra que entrara com as vendas do uísque, Buck contratou mais funcionários para o cultivo do algodão e levou Bill, que também estava ficando fraco em conseqüência da idade, para ajudá-lo a vender o uísque na cidade, e a engarrafar o destilado. Afinal, era um serviço mais leve e desta forma, Buck, também tinha mais tempo de fiscalizar os piões do sítio. Mas é claro que John também ajudava na função fiscalizadora. Tudo aquilo ainda era seu, porém estava muito satisfeito em saber que Buck herdaria suas terras algum dia.
O verão de 1881 no sítio The Little Pinewood passou rápido, todos estavam satisfeitos com o andamento das coisas. John começara a escrever seu livro, passou noites na varanda em claro fazendo anotações. Buck o incentivava. Bill arrumara uma namorada durante uma das entregas de uísque em um armazém da cidade e a visitava freqüentemente. Inclusive a presenteou sua nova amiga a família Hills. Ou o que sobrou dela.
Era uma negra de uns 60 anos, faceira, mas de olhos tristes, o abatimento fazia parte do condado de Sumter. Toda aquela região sofrera muito. Era difícil encontrar alguém que não tinha os olhos marcados pela guerra, principalmente aqueles que um dia haviam sido escravos. De toda a forma, Bill sorria com sua namorada e John e Buck simpatizaram muito com a Sra. Keith Miles. Principalmente Buck, que encontrava algo de Ann em Miles.
A Sra. Miles passava suas folgas no sítio e fazia assados magníficos. Buck voltara a sorrir, animado, satisfeito, e John sentia-se orgulhoso de ver e fazer parte da mudança. Após a presença da desgraça ter abatido o sítio com a morte de Ann no ano anterior. John notava que os sorrisos de Buck retornavam ao seu dia-a-dia. Nos últimos tempos, Buck andava pensando apenas em trabalho e riqueza, mas voltou a ser um homem de grandes sonhos, porém, de imaginação justa, a procura do campo: a verdadeira alma que o tinha moldado. O mundo selvagem, educado, a ordem solta, onde é o corpo que empurra a vida. Na qual ela faz parte do corpo, sendo a extensão eterna de algo que é finito. Assim, na longa ou na curta estrada, entre o início de qualquer plano para alcançar o objetivo final. Existe um trajeto que deve ser respeitado e vivido sem preocupações maiores. Sem questionamentos nulos, que acabam por decapitar a cabeça da vida, do corpo da natureza. O que John não acreditava ser uma vida digna, de ser vivida.
No inverno do mesmo ano, John sofre uma crise de úlcera, sentado na sua cadeira de “criação poética”, na varanda do Chalé. Treme sentado, agarrando-se na cadeira e perde muito sangue, jorrando como um chafariz da sua boca. Muito fraco John cai no chão sacudindo-se de maneira epilética. Quase inconsciente, acaba por esfolar toda a orelha direita de tanto tremer. No velho assoalho, áspero, de madeira. Bill vem de seu quarto e o encontra, ali, caído. Busca uma almofada e a coloca embaixo do resto da orelha de John. A almofada ficou encharcada de sangue e pedaços de carne. Apavorado sem saber o que fazer, Bill pega um balde da água e atira sobre John e sai a gritos a procura de Buck pelo sítio, e o encontra colhendo algumas folhas de fumo para enrolar, e ambos retornam correndo ao chalé.
Ao aproximarem-se do local, notam que John estava sentado, escorado na parede, com o pescoço pendido sobre o ombro esquerdo. Agarram John, carregando-o para o seu quarto, repousando seu corpo sentado com as costas escoradas na cabeceira da cama. Buck pede para Bill buscar socorro na cidade, mas John mesmo debilitado, com a boca, e a orelha direita ensangüentadas, consegue dizer algumas palavras.
- Hey Buck? Meu pequeno Cherokee. Mande Bill ficar frio, esta tudo bem, isso não vai demorar muito.
Mesmo assim, Buck não o obedece e aconselha Bill a procurar ajuda. Buck e John ficam a sós no quarto.
- Traga uma garrafa de uísque para cá garoto. Diz John. Antes de ter uma crise de tosse e vomitar mais sangue.
Buck chora, não sabe o que fazer. John se refaz da crise, mas mantém os olhos quase fechados. Faz força para permanecer consciente. Está com a fisionomia terrivelmente branca.
- Você não me ouviu garoto? Faça o que lhe disse!
Buck sai às pressas do quarto, ganha a cozinha, rapidamente está na varanda. Reflete sobre a situação, mas se mantém firme no seu objetivo. Busca uma garrafa de uma nova qualidade de uísque que ele vinha testando. Um pouco mais forte e com o gosto leve mente mais adocicado. Agarra a garrafa que estava no galpão da mini-destilaria. Meio atrapalhado, acaba derrubando um pouco do puro milho destilado, junto de alguns frascos vazios, os cachorros que estavam deitados próximos ao galpão latem por causa do barulho. Buck sai fora com a garrafa na mão, tremulo e nervoso. Olha através da entrada principal do sítio e avista a estrada de cascalhos extensa, e em linha reta, de um quilometro e meio, até perder de vista, mas não enxerga Bill, nem seu cavalo. Sente-se mais aliviado pensando que a ajuda está a caminho.
- O Gold Angel está aqui, meu velho. Diz Buck ao entrar no quarto. Referindo-se ao uísque que trazia consigo.
- Me de aqui. Diz John, quase desmaiando.
Ao pegar a garrafa e tentar levá-la a boca cheia de sangue, John a deixa cair sobre sua barriga derramando um pouco do líquido. Buck pega a garrafa e dá um gole na boca de John, que força com a mão no fundo da garrafa, com o intuito de empinar um gole dos grandes.
- Hey, que merda é essa Buck? Você quer terminar de me matar? Aqui no estado da Carolina do Sul, assassinato é crime. Ressalta John, apavorado com a patada de elefante que acaba de tomar.
- Eu ainda não tinha tido tempo de lhe mostrar.
- Não encontraria melhorar hora para tal. Ficou ótimo, meio doce, mas terrivelmente vivo. Eu posso conversar com um uísque desses. Comentou John tomando mais um grande gole do Anjo de ouro.
- Pai, fico feliz que gostou. Não se assuste. Bill deve estar voltando com ajuda ou um médico à uma hora dessas. Diz Buck.
- Pai, que história é essa?Pergunta John.
- É...desculpe.
- Cala a boca. Homem não pede desculpas. E se sou seu pai, não posso ser pai de um frouxo. Sua palavra é como um livro garoto. Depois de dita, está publicada, não pode ser apagada, apenas queimada e por você mesmo. Se você quer ser um Hills, lembre-se de nunca mais fazer isso. Aproveite para parar de choramingar, pois só tem um cara assustado aqui. E esse cara sou eu. Passe-me um cigarro. Tenho dois fechados no bolso daquela camisa ali pendurada no armário.
- Isso não lhe fará mal? A ajuda está próxima.
- Quando os Yankees invadiram aqui, um mês antes de você aparecer. Tomei um tiro no ombro direito e tive de permanecer três dias escondidos no campo dos Morrison, quando eles ainda tinham um. A única ajuda que tive foi deste tabaco. Então pare de me contrariar e se apresse.
Buck ajudou John a acender o cigarro. John deu algumas longas tragadas e a cor de sua fisionomia melhorou um pouco, mas ele voltou a tossir e vomitar sangue. Desta vez vinham bolas de sangue, grossas e escuras.
- Hey Buck? Existem duas coisas que você precisa saber sobre a vida. A primeira delas, é que ela é uma teta. E a segunda, é que você não deve se desgrudar dela nunca. Enquanto você estiver mamando deve engordar e aproveitar, não faça perguntas, pois perderá tempo e dará chances para coisas nulas adentrarem sua boca. Não perca tempo Buck. Isso é a única coisa que você não tem.
- Eu não perco tempo.
- Hey Buck? Eu ainda não morri. Então não me interrompa. Seu indiozinho fazedor de uísque. A vida não é nenhum tipo de aprendizado, apenas amor. Amor pelo que você acredita e que acha que deve ser feito. Como Ann e suas magníficas tortas de maçã ou Bill e sua devoção e carinho a minha família. Isto é precioso Buck. Demorei 50 anos para começar a enxergar e a viver. Estava no meu espírito, mas antes de você aparecer na minha porta, há 17 anos. Eu vivia inconscientemente. Grude na teta Buck, não desperdice o leite da vida. Disse John, agarrando fortemente a camisa do garoto com a mão esquerda dando pequenos trancos para baixo. Pouco antes de esticar-se na cama e fechar os olhos.
O velho John estava morto. Era o fim de uma boa, má, feliz e triste vida, com altos e baixos, assim como seria a de Buck e de muitos outros que venham a respirar e ter imaginação neste planeta. Buck não conseguiu ficar ali, empinou a garrafa que estava com o gargalo cheio de sangue e mamou, mamou e mamou. Os jovens nunca entendem uma lição como deveriam.
Buck saiu correndo rua a fora. Bill vinha pela estrada montado seu cavalo e atrás deles vinha uma charrete com algumas pessoas. A poeira se erguia na estrada. O sol da tarde transformava tudo em fogo. Bill e os demais ajudaram Buck que estava de joelhos no chão a levantar-se. Mas ele caiu de joelhos novamente com a garrafa na mão esquerda e a outra de punhos fechados batendo sobre a terra. Bill e os outros adentraram o chalé. Nesta tarde, iria ter mais uma pedra junto à grande árvore na colina do sítio The Little Pinewood.

O espremedor de laranjas

Meu primeiro emprego consistia em colher laranjas. Depois espremia as malditas sem parar, uma a uma, as milhares, num espremedor de frutas elétrico na garagem lá de casa. Eu tinha uns nove anos de idade. A garagem parecia um túnel, tão estreita, que tínhamos que sair pelo porta-malas do carro.
Meu pai trabalhava em uma fábrica de calçados, bem como minha mãe. Os dois vinham só para almoçar em casa. Passavam pouco tempo conosco. Pra ficar mais tempo comigo, meu pai me levava com ele nos finais de semana para colher laranja nos pomares do interior da cidade. Morávamos na fronteira do Brasil com o Uruguai. A Região da Campanha, como é conhecida. Tem as mulheres mais lindas do mundo e o pessoal mais educado e bêbado que já conheci. Rola as ditas carreiras por lá. Uma espécie de corrida de cavalos, mas em linha reta, cerca de um quilômetro e meio ao todo. Ali os cavalos correm feito doidos, os gaudérios bebem feito doidos, os torcedores brigam feito doidos, em acampamentos mais doidos ainda, durante dias e dias.
Era eu, um excelente espremedor de laranjas, mas não é tão simples como parece. A primeira etapa consiste em achar sacos bons para carregá-las. Tarefa difícil, que às vezes levava tardes inteiras a rodar a cidade de bicicleta, até encontrar em algum armazém ou galpão, atrás de sacos para transportar as malditinhas. Os sacos precisam necessariamente ser aqueles de 50 quilos, mais especificadamente, esses que utilizam para carregar milho. Depois de certo tempo já tinha muitos deles em casa, e a coisa ficou fácil.
Saíamos de carro por estradas de chão batido. Uma loucura digna de filmes Cult dos anos 70. Quase batíamos o carro em barrancos, devido a precariedade das estradas que foram feitas para carroças de boi e não para um Opala 76 andando a 80 Km por hora. Quando avistávamos um pomar decente ao longe, encostávamos e adentrávamos as terras até as laranjeiras. Muitas vezes andávamos quilômetros pelas propriedades até encontrar laranjeiras bem carregadas. Meu pai mais parecia um maníaco das laranjas. “Grande merda, qualquer uma serve”, pensava, “de qualquer maneira, vou ter que espremê-las mesmo”. Mas ele não descansava. Corria de hectare em hectare atrás das bolinhas de tênis espalhadas pelos campos.
Caímos em penhascos e nos lenhávamos todos. Voltávamos pra casa cheia de machucados e arranhões nas pernas e na bunda, de cair e rolar pelo mato. Fora as cercas de arame farpado. Cansados e eufóricos nós passávamos despercebido pelos arames, e feito: bastava para rasgar a carne naquelas merdas de cerca. O calor do verão não ajudava. Suava-se feito um boi no abate, com as pernas cortadas. E as mutucas? Insetos desgraçados que picam e grudam na pele suada, horríveis, grandes, feias e nojentas. Uma espécie de super moscas, moscas que mordem.
O velho se pendurava feito macaco nas árvores e começava o bombardeio, a tortura e as reclamações. Você tem que ser muito rápido com o saco aberto correndo em baixo da laranjeira. Bastava uma cair para ouvir poucas e boas, então me esforçava ao máximo. Meu velho era craque nisso. Tinha estrema habilidade, mas eu era melhor que ele no que eu fazia, só tinha nove anos, além do mais a pior parte ficava para mim. Ele ia arrancando as laranjas do pé e nem olhava onde elas iriam cair, eu tinha que ficar olhando pra cima enchendo os meus olhos de cisco e sujeiras mais diversas que despencavam das árvores. Uma corrida sem fim, um inferno na terra, nada é fácil, nem quando se tem nove anos, é preciso provar algo, sempre e continuamente a você mesmo, a alguém ou Deus. “Eu consigo”, espirrava a sujeira esfregava a cara e corria em busca da chuva laranja.
Após encher uns cinco sacos de 50 quilos, tínhamos que transportá-las para o carro. A volta era terrível, muitas e muitas vezes estávamos longe da barca. Pegávamos o saco entre dois e transportávamos os sacos até o carro, tarefa que ocupava muito tempo. Era necessário fazer no mínimo umas cinco viagens de ida e volta. Com o porta-malas da barca carregado, começava o rally de volta pra casa. Esqueci de dizer que “barca”, era como eu chamava o opalão prata do coroa.
O sol baixando pelos campos, pelas seis horas da tarde é uma sena linda na campanha, algo recompensador, depois de se ter enfiado toda a tarde de sábado no cu.
Na garagem de casa atirávamos os sacos perto da máquina de lavar roupa e corríamos para o banho e na seqüência para a mesa comer. Bauru de forno, minha mãe tinha a manha de fazer bauru de forno, sempre rolava um quando íamos fazer a colheita. Na volta aquele rango esperto regado a katchup e maionese recompensava qualquer sacrifício, depois era só se esticar na cama, todo ralado.
Na segunda feira o inferno recomeçava, as cobranças eram feitas ao meio dia, na hora do almoço, assim que chegava da escola. Na mesa, na hora do almoço.
- Francisco, já espremeu alguma? Não estou vendo suco na mesa!”Dizia meu pai, enquanto minha mãe completava: - Vocês não tem compromisso nenhum alem de estudar”, se referindo a mim e aos meus irmãos, mas se não tínhamos nada pra fazer a não ser passar de ano; porque eu tinha que espremer as malditas laranjas? A cerca disso, estava eu, pronto para apertar, apertar e apertar as bandidas na máquina.
Não compro nada da Arno, isso não colaborará em nada para eu vender este conto, mas não compro e se você comprou, é porque foi enganado, seja pela Arno, ou pela editora, por você mesmo, e também esqueci sobre o que estava falando. Ahhh, Arno, sim, o espremedor de frutas era desta marca, por isso não compro nada, é um trauma pessoal saca? E ai todos temos os nossos, então... Era de uma cor bege, tinha na parte de cima um merdinha de plástico onde se espreme a polpa da laranja, aquilo vivia caindo, era um saco. Espremer e espremer, depois virar aquele liquido dentro de um funil preso ao bico de uma garrafa pet de dois litros e botá-las para congelar no freezer.
O destino prega umas coisas muito engraçadas. Mais tarde virei empilhador de lenha, cortador de grama, vendedor de picolé, servente de pedreiro, coveiro, pintor, marceneiro, carpinteiro, vigilante e, agora escrevo essas linhas escutando David Bowie dentro do Diretório Acadêmico de Filosofia da Universidade onde estudo.
Imagino que não ganhei nada, além de dor, por todos os outros afazeres que tive nessa vida e mesmo assim não esqueço o quanto era horrível espremer aquelas malditas laranjas, pois isso não me deixou mais humilde, apenas me impôs uma condição.
Adoro vodca com refrigerante de laranja, é minha bebida preferida. Talvez tenha alguma ligação com essa porra toda, mas não sei se isso faz sentido ou não. Somos empurrados a fazer coisas que não queremos por tanto tempo que acabamos repetindo-as depois, involuntariamente como máquinas de 380 volts ligadas na tomada que não param, a não ser quando precisam de manutenção, ou quando são substituídas por outras, mais velozes, rápidas, modernas.

Positivismo lógico

A realidade é factual
como uma notícia no jornal.
“Caminhão atropela criança;
pai mata mulher, filhos
e se suicida”.

Nós sobre-vivemos há
alguns porres homéricos,
juntos, sós, entediados,
chorando pouco, rindo
muito, buscando sabe
lá deus o quê.

Agora aqui, amanhã amnésia.
Todos têm direito ao erro
numa vida cheia de enganos,
desconfiança; positividade
para esconder a realidade.

Fome é fome, apenas fome,
saudade é saudade, só isso:
fugir da dor, procurar o prazer.
Depender da sorte sem aceitar
a predestinação.

Loucura maior que essa;
apenas viver apaixonado e
esquecer que tudo isso existe.

Trocando de estação

Então ali estava ela,
olhos bonitos, boca
e tudo mais.

As coisas aconteceram
rápidas, loucas,
dançantes.

As manhãs pareciam
noites e as noites
pareciam tardes,
num fogo gelado,
de frio queimando.

O que nunca fez sentido
agora posso entender:
a felicidade é coisa rara,
mas se pode evitar sofrer,
principalmente quando se sabe
aquilo que se quer fazer.

E as noites voltaram a ser noites
e os dias...
Ahh!!!
Apenas dias.

Corpos pelas calçadas,
folhas voando na primavera.
um gole de cerveja,
alguns cigarros e o amor,
um brinquedinho nas mãos
de outras crianças.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Morte lenta

Então chegou a primavera,
quente no sol e frio na sombra.
Os ventos são outros,
as canções também;
tiros no escuro.

A cabeça cheia de flores
o dia inteiro e as coisas
cada vez mais malucas.
Curtindo, curtido,
destilado aqui é brincadeira.

Vodca com Sukita

Empino o copo escorado no balcão
enquanto elogio a garçonete e
discuto as eleições com
o dono do bar.

Linda, cabelos pegando fogo,
branca, sexy e maluca,
se senta ao meu lado.

“Zóio de gato”, digo,
balançando o gelo no copo.
“já tá bêbado”?
Me pergunta, rindo
Da minha cara.

Compra fichas para
sinuca e vai embora.
Esvazio minha birita:
nunca sei se ela vai voltar.

Sono, lembrar, não dormir

O incrível nisso tudo é saber estar ferrado.
Dos por quês, um após o outro e continuar
mergulhando no álcool, beber e beber...

Estar apaixonado é estar bêbado,
alcoólatra, mais, sexo, beijos
- tolerância

Lamber suor.

Tremer no calor, correr sem saber
para os braços qualquer
como se estivesse indo pro bar.

Estado doentio.

Tratável com a morte que sonda
o bebum a cada gole, como o fim
instalado a cada crise de ciúme.

Nada dura pra sempre.
Antecipa-se, mata-se, castra-se
qualquer forma de eternizar
espíritos apaixonados.

A razão não enxerga o amor,
ela sente e diagnostica a dor.
Assim como faz um pé de cana,
que espera o fim a cada gole.

- Desce mais uma,
por favor.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

O dêmonio é mulher e tem cabelos cor de fogo

Embriagado de vida me pergunto:
“porque você está aqui”?
Mas a pergunta é outra:
“porque estou aqui”?

Porque foge de mim?
Não fujo de você,
não tenho medo.

Há algo além loucura
quando te vejo,
além do desejo
quando te cheiro,
além da imortalidade
quando te beijo e,
é isso que quero!

O que tens medo,
Sua coragem de coisas
Que guardo segredo.
Sentimentos diferentes,
ambições iguais.